31 julho 2025

LIBERTANDO SUAS VOZES

  

Libertando Suas Vozes

Houve um tempo
em que as palavras dormiam em cavernas,
medrosas do mundo,
caladas em mim.

eu andava com o peito cheio,
mas os olhos vazios.
um semáforo interno sempre no vermelho.

até que um dia,
uma fresta se abriu —
pequena, tímida, mas infinita —
e dela saíram
minhas vozes esquecidas:

as que cantavam sem medo,
as que choravam sem vergonha,
as que gritavam para não desabar,
as que apenas sussurravam "estou aqui".

libertar as vozes
é aceitar que se é
muitas.
confusas,
contraditórias,
vivíssimas.

e que ser inteiro
é ser incompleto sem medo.

por isso, hoje,
não amarro mais as palavras:
eu as solto,
eu as entrego,
eu as deixo viver
como vento
sobre mim.



PELE E MADRUGADA

  

PELE E MADRUGADA

(VERSÃO LÍRICA)

A pele se expõe à luz tênue,
tocando a quietude da madrugada,
quando tudo ainda está por dizer,
mas o corpo já sabe o que quer.

Entre os poros, o peso das horas
que se arrastam devagar,
enquanto o mundo adormece,
o silêncio é profundo e pleno.

O toque da noite é sutil,
quase imperceptível,
como um suspiro que se dissolve no ar,
perdido entre o que é e o que nunca foi.

Não há palavras.
Só a respiração,
o ritmo que não se apressa,
um movimento sem direção,
uma busca constante por algo intocado.

A madrugada veste o corpo
como um manto invisível,
e a pele, agora nua,
se funde com o instante
onde o tempo não é mais amigo.

E é nesse espaço vazio,
onde a ausência se faz presença,
que a pele se encontra com a madrugada
e ambos, sem se explicarem,
se tornam um só.



30 julho 2025

O PESO DO SILÊNCIO

  

O Peso do Silêncio

pode ser silencioso,
se o silêncio for o que pesa.

há vozes que se calam
não por medo,
mas por excesso.

há gestos que desistem da palavra
porque o eco já diz tudo.

e então, eu me sento,
com a boca quieta,
com o peito cheio,
com os olhos gritando mares.

não há urgência em falar,
quando o sentir transborda por si.

pode ser silêncio,
se for verdadeiramente silêncio —
um espaço denso,
um abraço mudo,
um universo inteiro
entre um suspiro e outro.

às vezes, o que mais pesa
não é o que falta dizer,
é o que já foi sentido
e permanece
sem precisar de som.




29 julho 2025

A VONTADE DE CHORAR

 

 A Vontade de Chorar

e houve a vontade de chorar,
sem drama,
sem anúncio,
sem plateia.

só eu,
e a vontade,
sentados lado a lado,
como velhos conhecidos
que se olham e não dizem nada.

não era tristeza de novela,
nem alegria rasgada —
era apenas um excesso de sentir,
um rio querendo transbordar
sem pedir desculpas.

houve a vontade de chorar,
e eu não corri.
não lutei.
não escondi.

deixei o peito ficar pesado,
deixei o tempo se arrastar,
deixei o mundo seguir
enquanto eu aprendia a ser frágil
sem vergonha.

PORQUE ÀS VEZES 

CHORAR NÃO É FRAQUEZA -

É SIMPLESMENTE

UM JEITO DE CABER EM SI MESMO




28 julho 2025

E HOUVE O CHORO

  

E Houve o Choro

e houve o choro,
sem aviso,
sem piedade,
sem explicação.

um nó na garganta
que já era velho
cansou de ser nó
e virou rio.

não era bonito,
não era feio —
era só urgente.

o corpo sabia,
antes da razão,
que havia algo a lavar.

e eu deixei.
deixei a enxurrada romper,
deixei a voz falhar,
deixei o rosto se perder.

porque às vezes o que salva
não é ser forte,
é ser água.

e naquele instante,
eu fui água,
eu fui choro,
eu fui inteiro.




27 julho 2025

EXPLOSÃO ANTIGA


 Explosão Antiga

A vontade de chorar
já era velha,
morava quieta
no canto dos dias.

dormia entre os dentes,
se escondia nos olhos,
fingia ser esquecimento.

mas um dia,
sem mais disfarces,
ela explodiu.

não em soluços pequenos,
não em lágrimas tímidas,
mas em rios —
fortes,
impossíveis,
indomáveis.

o peito desaguou,
a alma transbordou,
o mundo inteiro ficou molhado.

e foi nesse dilúvio íntimo
que descobri:
algumas dores não morrem,
elas esperam o momento
de virar água
e finalmente
partir.



26 julho 2025

VELHA EXPLOSÃO

  

Velha Explosão

A vontade de chorar
era velha.
rancorosa, quieta, esquecida.

até que um dia
não coube mais.

rasgou meu peito,
rompeu meus olhos,
virou rio,
virou grito,
virou nada.

e eu,
afogado em mim,
fiquei vazio
pela primeira vez.



25 julho 2025

O SOM DA CURA

 

 O Som da Cura

E ouvi o choro —
não de fora,
mas de dentro.

um choro rouco,
antigo,
feito de palavras que nunca nasceram.

e ouvi o choro
sem medo,
sem pressa,
sem fuga.

depois,
entre uma lágrima e outra,
houve um silêncio.
um silêncio novo,
que não doía mais.

e nesse espaço limpo,
nesse eco sem peso,
ouvi —
pela primeira vez —
a cura.

não veio em forma de grito,
não veio em promessas brilhantes,
não veio em festa.

veio em sussurro,
veio em leveza,
veio em mim.




23 julho 2025

HOUVE O CHORO, HOUVE A CURA

 

Houve o Choro, Houve a Cura

houve o choro.
não disfarçado,
não negado.
chorou-se tudo:
as dores antigas,
as saudades escondidas,
as raivas sem dono.

houve o choro —
e com ele, o desabar necessário,
o despir da alma,
o alívio bruto.

depois,
houve a cura.

não de repente,
não com fogos de artifício.
veio como vem a manhã:
devagar,
suave,
certa.

e ali, onde antes era só cansaço,
nasceu um espaço novo.
leve,
vivo,
possível.

houve o choro.
e porque houve o choro,
houve a cura.


22 julho 2025

O ECO E O ESPAÇO

 

 O Eco e o Espaço

E o espaço era limpo,
como quem varre a alma
de tudo o que foi peso.

não havia móveis velhos,
nem retratos gastos,
nem vozes demais.

só o vazio.
só o branco.
só o respirar.

e no meio desse espaço limpo,
o eco.
não um eco leve,
não um eco esquecido —
mas um eco com peso,
com memória,
com carne.

o que eu dizia voltava para mim,
cheio de verdades que eu temia ouvir.

e o espaço, tão limpo,
não escondia nada.

e o eco, tão pesado,
não perdoava mentira.

entre o silêncio e o som,
eu me encontrei.
e me perdi.
e me encontrei outra vez.


 

21 julho 2025

ECO

  

Eco

E o que eu dizia
voltava.

não como resposta,
mas como ferida
ou como cura.

dependia
do que saía da minha boca.



20 julho 2025

PESO EMOCIONAL

 

Peso Emocional


Carregava,
sem perceber,
o que não tinha nome,
o que não pedia abrigo,
o que não sabia partir.
era como um peso emocional:
sem forma,
sem rosto,
mas presente em cada passo.
não era dor aguda,
nem tristeza clara —
era só esse cansaço
que amassa os dias,
que apaga as manhãs,
que enfraquece a alma devagar.
e eu seguia,
arrastando o invisível,
sem coragem de soltar,
sem força para carregar.
até que entendi:
alguns pesos não são para lutar,
são para deixar ir.
e naquele instante,
fui mais leve
do que jamais imaginei ser.

 

Verdade

Aprendi a dizer
com mais verdade:
menos palavras,
mais alma.      



                    Peso e Liberdade

                            aprendi:
                            verdade pesa,
                            mas liberta.






19 julho 2025

DEGUSTANDO VERSOS

 

Degustando versos

 

Hoje, não quis resolver o mundo.

Quis apenas brincar

de degustar versos,

como quem prova

pedaços de tarde

em colherinhas de silêncio.

 

Deixei que uma palavra

derretesse na língua

como fruta madura.

Deixei que outra escorresse

pelo céu da boca

e tocasse o paladar

da lembrança.

 

Verso bom,

é aquele que não se engole com pressa.

É o que insiste em ficar,

entre um gole de céu

e um pensamento que ainda ferve.

 

Brincar de degustar versos

é como comer o tempo com as mãos:

sem etiqueta,

sem pressa,

sem culpa.

 

E quando acaba,

a gente lambe os dedos

do sentido,

esperando o próximo poema

surgir do fundo da alma

como um sabor inventado.




18 julho 2025

GOSTO DE ALGODÃO DOCE

 

Gosto de Algodão Doce

 

Tenho saudades sim,

dessas presenças que em mim moravam

com a leveza do algodão doce,

derretendo na memória,

doce e efêmero.

 

Ou da firmeza macia

da bala de goma,

que resistia um pouco mais

ao tempo, à boca,

deixando um sabor duradouro

na língua da lembrança.

 

Pessoas que não se desfazem,

mesmo quando a vida as leva

para outros potes, outras festas.

Elas ficam, presas nos poros da alma,

como açúcar cristalizado,

um doce vestígio do que fomos juntos.

 

Não se esquecem. Não há como esquecer o gosto bom que deixaram, a textura macia de seus risos, o colorido vivo de suas almas. E a saudade, ah, a saudade é só o suspiro que precede mais um doce recordar.

VÍCIO

 

VÍCIO

 

Identificou-se com a sua irritação

por perceber-se sem o computador

amigo fiel de todas as madrugadas

insones.


A solidão,

como máquina que tritura,

habita seus medos,

seus horrores,

seus mais desconexos

instantes,

que ele próprio não identifica.


Percebe-se ligado em elo à máquina

                           (que hora lhe falta).

São textos

tantos/tantas

fotos,

fatos,

verdades,

boatos,

encontros baratos.


Sai em meio à escuridão que madruga

a percorrer alguma avenida

à procura

da primeira lan house noturna

que lhe sacie o vício.


 

17 julho 2025

O ECO SEM VOZ

 


O Eco Sem Voz

 

A saudade que não faz barulho.

Ela não grita, não chora,

não rasga o tecido da noite.

É um sussurro etéreo,

um sopro morno

no avesso da alma.

 

Não há estampido, nem furor.

Apenas um ressonar subterrâneo,

como a maré que recua em silêncio

deixando a areia úmida.

Uma vibração sutil,

o zumbido de uma memória

que se recusou ao esquecimento,

mas que não pede palco.

 

É a presença da ausência

em sua forma mais pura.

Não a ferida aberta,

mas a cicatriz suave,

que a gente toca sem querer

e sente o relevo do que foi.

Uma melancolia aquietada,

que não exige prantos,

apenas o reconhecimento

de que algo existe,

e sempre existirá,

no fundo.

No lugar mais profundo

onde o som não chega,

mas a sensação permanece.

 

 


GRITO

 



Grito

 

O eco do nada

na garganta seca.

um berro mudo

que rasga o ar

e não encontra ouvido.

 

o sol de junho,

mesmo em barra do piraí,

não aquece o vazio

deste grito sem rumo,

sem porto.

 

é a voz do deserto em mim,

areia fina que escorre

entre os dedos da memória.

não há lamento,

não há revolta

nem volta.

apenas o som puro

de uma existência

que se recusa a calar,

mesmo sem ter o que dizer.

 

é o ruído branco da alma,

um sussurro amplificado

pela ausência de sentido.

e ainda assim, grito.

grito sem causa,

grito sem propósito.

apenas para saber

que ainda posso.


ONDE DESAGUAR

 

 


Onde Desaguar

Ninguém viu quando me tornei sombra,
nem quando o silêncio me vestiu.
Fui partícula esquecida no véu do tempo,
uma pergunta à deriva no escuro.

Havia em mim o relâmpago contido,
o grito que nunca encontrou eco.
Mas o abismo me ensinou a escorrer,
e eu desaprendi o fogo.

Agora sou um rio manso,
onde desaguar não é fim,
mas rito secreto de retorno
àquilo que nunca se foi.

Nas minhas margens, as vozes se curvam.
Nas minhas águas, a dúvida dorme.
Quem me toca, perde os nomes.
Quem me segue… se esquece.

Sou o caminho que não leva,
a calma que engana,
a promessa que sussurra:
“Vem — e desfaz-te.”



 Onde Desaguar — Parte II

Sou o que resta quando tudo se vai.
A última brisa depois da tempestade esquecida.
Carrego em mim os segredos dos que partiram
sem dizer adeus,
e os suspiros dos que ficaram… calados.

Não me busques em mapas.
Sou desvio, sou margem que some.
Meu leito é feito de ecos,
e minhas águas sabem o que tu negas.

À noite, os astros se curvam sobre mim
como olhos antigos, vigilantes.
Sabem que não sou o rio —
sou o sussurro que o rio aprendeu a guardar.

E aqueles que ousam mergulhar
não voltam os mesmos.
Voltam com o olhar vazio de certezas
e o coração cheio de perguntas.

Pois em mim, não se nada —
desliza-se.
E todo aquele que tenta conter-me
é levado…
para dentro de si.


 

Onde Desaguar — Parte III - 

(O Fim que Se Dissolve)

Fui tormenta, fui vertigem.
Hoje, sou apenas fluidez.
Mas não te enganes com minha calma —
há relâmpagos dormindo no fundo.

Agora sou um rio manso,
mas levo impérios soterrados,
memórias que afundaram sorrindo
e nomes que o tempo esqueceu pronunciar.

Às vezes, no silêncio entre duas margens,
sinto tua presença —
como se fosses feito da mesma ausência que me molda.
Talvez sejas também água disfarçada de corpo.

Desagua em mim, se ousares.
Não como quem busca um porto,
mas como quem aceita o naufrágio
como forma de voo.

Pois eu não ofereço chegada,
nem consolo,
nem forma.

Apenas o eterno desdobrar do mistério
que és tu
encontrando a si mesmo,
num espelho que escorre.










16 julho 2025

CADERNO ABERTO

 

  Caderno Aberto

Um caderno aberto
não pergunta por quê.
A folha aceita o que vier:
silêncio, rabisco,
vento de mulher.

Não exige forma,
não impõe juízo.
Aceita o risco
de um céu partido,
de um riso indeciso.

Quem escreve, voa.
E quem voa, vê
que a criação
é ponte de luz
sobre o talvez.




15 julho 2025

LIVRE PARA CRIAR

 "Livre para Criar"

É livre o gesto,
na palma da ideia —
onde a palavra espera
e o mundo inteiro cabe.

Não há cerca no sonho,
nem muro no verso
que nasce de dentro,
no tempo disperso.

Podes criar:
um céu de marfim,
um rio sem nome,
um segredo de jardim.

Aqui, o verbo é caminho,
e a escuta, alvorada.
A poesia não teme
nem mesmo o nada.

Apenas há limites
para o que fere ou destrói —
mas o que acende e abraça,
ah, isso é só teu e só dói
de tão belo.