31 agosto 2025

PREFÁCIO

  

Prefácio

Vicente Siqueira não escreve para explicar o mundo.

Escreve para atravessá-lo.

Seus poemas são fragmentos de pensamento, 

vertigens de sentimento, 

lampejos de silêncio.

Aqui, cada palavra tropeça, 

cada ideia corre, 

cada instante é uma tentativa de tocar 

aquilo que sempre escapa: 

o ser.

Um livro para quem já amou, 

já duvidou, 

já perdeu o chão — e, 

mesmo assim, 

seguiu escrevendo dentro de si.







 Problema meu

Eu sei.
isso é um problema meu,
inteiramente meu.
fui eu que li mapas onde você só rabiscou, distraída,
fui eu que dei nome a ruas que não levavam a lugar nenhum.

Então,
antes que o refrão recomece,
antes que a ponte musical me iluda de novo,
eu prefiro fugir no final da canção —
mesmo querendo ficar.

Não por orgulho,
não por drama,
mas porque aprendi a não insistir em danças
onde só eu conheço os passos.

Meu adeus vai ser baixo,
como quem sai de fininho
de uma festa onde ninguém notou que chegou.

E tudo bem.

No repeat da memória
vou lembrar mais do que foi bonito
do que do silêncio entre uma estrofe e outra.

Porque, no fundo,
algumas canções são feitas pra tocar só uma vez.
e isso não tira delas a beleza
— só a ilusão de que durariam pra sempre.


 

Talvez eu me dê uma importância

Talvez
eu me dê uma importância na sua área afetiva
que você nunca me deu.

talvez
eu more em um cômodo do seu coração
que nem existe.
talvez eu tenha inventado a chave,
a porta,
e até a planta da casa.

talvez
eu tenha lido sorrisos como sinais,
mensagens como promessas,
silêncios como espaço reservado.

no fundo,
talvez você só tenha me deixado passar,
como quem segura o elevador pra alguém estranho —
educado, mas sem destino comum.

talvez eu tenha feito altar
onde você só estendeu a toalha do café.
talvez eu tenha sonhado à beça
num campo onde você só encostou pra descansar.

e tudo bem.
não é erro seu.
não é maldade minha.
é só desencontro de sintonia —
a velha arte de supor reciprocidade
em ondas diferentes.

talvez eu me dê uma importância
que não tenho.
mas olha:
a minha parte foi sincera.
e às vezes, isso basta
pra seguir em paz.

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