30 setembro 2024

THYSSEN, COMO EU VI

 THYSSEN, COMO EU VI

 

São tantas as fábricas.

Da mesma maneira que a primeira,

Por ser talvez a única e com certeza também a última.

Tudo novo, como novas eram as esperanças.

Pessoas. Visual. Ruídos. Odores. Calores.

Ah... Os calores.

Subindo grandes escadas de ferro em direção aos fornos.

Impressão de quadro surrealista.

O vai-vem das pontes rolantes, rolando. Guindastes.

Guindasteiros. De um lado para outro.

Burburinho de cadinhos

de análises,  de gusa, de sucata, de cromo,

cheiros de enxofre, fumaça de zinco, pó de areia,

pipocar de marretas, respingos de ferro.

Líquido que é ferro.

Como ferro é líquido e sua cor é laranja.

Precioso em vazamento  alaranjado.

Abundantes panelas.

Visão de sonho.

Sonho acordado.

Sonho de quem quer ter visões sonhadoras e práticas.

Sonho de se sonhar com gosto e sem sono.

Todo o quadro é parte. As partes se juntam.

Juntas são imenso organismo, são vivas as partes

E pulsam e se organizam em mínimos detalhes.

E as partes são órgãos.

 

Homens são partes. Homens são órgãos.

Cada homem, cada roupa, cada proteção, bizarras máscaras.

E são gerentes, diretores, soldadores, motoristas,

Tudo é como célula e trocam com o meio, e recebem e dão experiências.

Varredores, carregadores, eletricistas,

Levanta-se a marreta, quebra-se canais.

E são mecânicos, bombeiros, programadores, desenhistas,

Vazamento dos pingos de líquido quente no cadinho para análise.

São compradores, vendedores, borracheiros,estoquistas,

Tudo troca, tudo como uma procissão

que levasse o manto sagrado de uma religião.

São vigias, engenheiros, seguranças, economistas,

Como uma visão de Salvador Dali,

assim quando o mestre surrealista vislumbrasse

Todas as suas irrealidades dentro do quadro real da fundição dos metais.

Surrealismo em contato direto com os sentidos do real.

Presidente, forneiros, pedreiros, dentistas.

Se é indústria de ferro e aço é como uma qualquer outra religião.

Rebarbadores, químicos, tradutores, telefonistas

Tem prosélitos ardorosos, tem opositores ferozes.

 

Mais além divisei pessoas varrendo a via.

Vi pessoas subindo escadas para pintar imensos cilindros,

que me pareciam tonéis.

Vi homens de macacão cinza, uniformes azuis, roupas comuns.

Tinha homens de capacetes brancos, capacetes vermelhos,

Capacetes amarelos, verdes, mas não tinha cor-de-rosa.

Também tinha homens sem capacete, homens de blusa,

E homens de colete.

Homens de preto. Homens de branco.

Tinha homens de jaleco.

Homens quebrando.

Homens soldando.

Tinha homens pintando. Homens varrendo.

Tinha gente limpando, gente engraxando,

gente ao telefone, gente nas pranchetas,

gente atrás de grandes mesas, gente à frente de grandes destinos.

Todos os destinos todos de toda essa gente.

Tinha gente cavando, gente aterrando,

gente serrando, gente emendando.

Vi homens com martelo, homens com bicos de solda,

homens com bicos de bunsen.

Vi homens brancos sujos de pó preto. Vi homens pretos cobertos de pó branco.

 

Vi mulheres.

Vi mulheres que mandam. Vi mulheres que executam.

Vi mulheres que obedecem. Vi mulheres que riem. Vi mulheres que choram.

Vi mulheres felizes, vi mulheres que sofrem.

Vi pássaros, vi grama, vi árvores, vi fumaça, vi poeira.

Vi água, vi gases.

Vi homens dirigindo caminhões, guiando tratores;

Conduzindo empilhadeiras, comandando destinos, brandindo aço,

Temperando ferro, alimentando fogo.

Vi fornos e corridas. Vi formas e fôrmas.

Vi machos e machos.

Vi cilindros prateados, escadas azuis, tubos vermelhos,

mangueiras amarelas, tetos cinza, sonhos dourados.

Eu vi trabalho.

Eu vi muito trabalho.

Este foi meu sonho dourado quando estava bem acordado.

 

 


 

15 setembro 2024

SINAIS DE SILÊNCIO

 

Sinais em Silêncio

 

Não houve necessidade de mais "perdoas",

Nem de juras apressadas.

Teus olhos, profundos, me diziam tudo

No instante em que a porta se fechou

E o mundo lá fora se dissolveu.

Meu olhar, respondendo ao teu,

Era o eco suave de "sim".

 

Teus dedos, entrelaçados nos meus,

Falavam de caminhos que se reencontram,

De pontes erguidas sobre abismos.

O contorno suave do teu rosto

Sob a palma da minha mão,

Um mapa redescoberto,

Cada traço, um livro de memórias

Reescrito sem uma só palavra.

 

O fôlego suspenso, depois o suspiro conjunto,

A melodia mais pura que já ouvi.

Os corpos, antes tensos,

Agora um só, sem costuras,

Na dança lenta de quem retorna ao lar.

E em cada gesto, em cada respiração sincronizada,

A promessa silenciosa de um novo começo,

Gravada na pele, na alma, no ar que nos envolvia.