01 julho 2007

RECOMEÇA A SEMANA

(Tributo a Marilu)

Começava a semana onde terminava a outra
Que não podia ser de esquecimento
Mas havia lágrimas. Às vezes, havia.
Eu me movia e todos nos movíamos
Com movimentos decisivos
Porque nos movíamos, os dois,
Como pedras de xadrez.
Mas não éramos só as pedras do tabuleiro,
Mas também, o próprio tabuleiro
Com suas casas brancas, suas casas pretas, seus peões, seus cavalos.
E nem era preciso que eu me escondesse.
Mas eu me escondia.

Eu me escondia atrás das torres para seqüestrar a dama com fins escusos:
Com o fim de ir apreciar os nasceres de sóis, com ou sem praias e areias.
A dama deixava-se mostrar toda nua por entre as alamedas do castelo
E nem nos preocupávamos com os pores do Sol.
Porque sabíamos que logo após os fins das semanas.
Outras semanas viriam e
Iniciaríamos O jogo.
O jogo consistia em desmanchar as minhas grades.
As grades de que um homem é feito.

Era tudo muito jovem e ainda éramos todos muito jovens.
Eu me admirava com a serenidade que emanava da beleza dela
Era começo de abril , se bem me lembro,
Quando se fizera o conhecimento das verdades
Que a vida me mostraria.
As flores de maio já explodiam em profusão de cores
O homem sequer sonhara em desembarcar na Lua.
Naqueles tempos eu ainda aguardava a chegada dos doze anos.
Uma dúzia de aniversários e meia dúzia de sonhos.
E tinha na professorinha recém-chegada aos dezenove
O meu melhor presente.
Não se cogitava em futuro.
As coisas aconteciam no agora
A vida urgia no presente.
Naquele presente.






A vida na roça tem a vantagem das escondidas por entre os emaranhados
Do canavial, do milho verde, do laranjal.
O açude não era propriamente perto,
E em seu caminho sempre se encontra uma curva a mais,
Uma moita a mais, uma vontade a mais..
Eu me embriagava com a sua vontade de me mostrar os caminhos.
Seis ou sete anos mais velha, mas ainda assim jovem.
A terra vibrava por sob nossos corpos
E não havia meios de nos fazer parar

Não se percebe, ainda, a presença da virilidade
E a infância ainda se arrisca nos estilingues
E bolinhas de gude.
Mas o pensamento é de homem feito
O pensamento é de quem já tem cabelo no peito
Calor no beijo e amor com jeito.
Começa a semana e sente-se a vontade
De verter-lhe nos lábios o olhar
Um olhar na boca entreaberta perfeita
Nas pernas lisas e claras de menina rica
E a perfeita sincronia das virilhas e do umbigo.

Sincronia, também, entre dentes e língua.
Bocas que se procuram em toques esbaforidos
Braços com medo das amplidões e dos descampados
Começo dos vôos em territórios inexplorados
Beijos e pescoços e seios e nucas.
Cabelos de ouro escorrendo pela aura, pelos ombros
Pela grama.

E a vontade
De adivinhar-lhe a alfazema
Recendida debaixo do diáfano vestido de algodãozinho?
Sem maiores detalhes a não ser o seu próprio corpo tão detalhado.
Aí as cores enfeitavam os céus,
O açude era mais refrescante e os frutos sazonados
Eram mais abundantes.
E quando a semana já se sentia tão catastroficamente confusa,
A ponto de perceber-se que todo sábado ela precisava voltar para
A casa dos pais?
Todos os eixos saíam de seus encaixes e era como se de repente
Se morresse por dois ou três dias.
Morria-se.
Milhares de mortes.
Sem que ninguém à volta entendesse.
Até que outra semana começasse.

E as estações se sucediam.
Novos ventos e posições, pelos medos
E pelas imposições da situação que chega
Com a chegança da puberdade.
Ainda segredo, como sempre.
Nada de mistério, mas segredo guardado a ferro
E cadeado.
Aos dezesseis a mudança, a ida, a partida,
A alma ferida
Até o ponto do choro e lágrimas mais sentidas
Por dias e dias.
A cabeça completamente perdida.

Centenas de vezes imortalizada na carne
E no pensamento,
No coração e
No fogo das paixões mais desejadas.
Alguma incursão esporádica com a chegada
Do quartel e da farda,
Mas nada que pudesse desmanchar
O matrimônio que viria perfeito,
Feito de inteligência, repressões e conveniência.

Estou me despedindo de você, “Maria”.
Onde quer que você chegue
Deus há de lhe fazer companhia.
Vá, chegue primeiro, novamente.
Busque mais além o lânguido bafejar da satisfação
Por ter-nos feito interpretados e entendidos
E creia: onde quer que você chegar
A semana haverá de recomeçar.


29-04-06

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