04 abril 2025

ESCRITA VIVA

 

Escrita Viva

aí que estoy aqui
(querendo você, sim, ainda)
mas mais do que isso,
querendo viver essa página
com a letra da minha mão.

tem um sabor bom
em protagonizar a própria cena,
respirar fundo e dizer:
“essa linha fui eu que escrevi.”
sem rascunho, sem dublê,
com erro, acerto,
e um certo charme nos desvios.

mas também percebo:
nem tudo é tinta minha.
às vezes é a vida que pega a caneta
e me rabisca de um jeito
que só depois eu entendo.

no fim, é parceria:
um pouco eu que invento,
um tanto ela que me revela.
tem dias que sou autor,
tem dias que sou personagem,
e às vezes sou só uma frase
que ela decidiu guardar.

e tudo bem.
porque se a história me escreve,
é porque ainda estou sendo lido
pelas horas, pelos ventos,
pelo amor que ainda atravessa
essas páginas vivas.



03 abril 2025

DESINSTALEI A REALIDADE

 Desinstalei a Realidade

deletei o despertador
e o cinza das segundas
desativei notificações de urgência
e o boletim do caos

saí do grupo da ansiedade
arquivei a pressa
formatei memórias que doíam
em silêncio de nuvem

me reinstalei
em pixels de poesia
em cafés que não esfriei
em olhos que não desviei

sem wi-fi com o mundo
mas com sinal forte no peito
vivo em modo avião
navegando dentro

desinstalei a realidade
pra fazer download
de mim

02 abril 2025

A GRAÇA DO GESTO

 A Graça do Gesto

 

Mãos abertas sobre a mesa,

um mapa de linhas entrelaçadas.

Toque leve,

quase um sussurro.

 

As lágrimas descem,

claras,

enquanto o sorriso se abre,

um arco-íris sobre a dor.

 

Há beleza nesse instante,

essa mistura tênue

do que fere

e do que acalma.

 

A vulnerabilidade exposta,

um presente mudo

entregue

entre a alegria e o pranto.

01 abril 2025

FÔLEGO BREVE

 

Fôlego Breve

 

O universo, um suspiro.

A existência, um piscar de olhos,

entre o nada que foi e o nada que será.

Pontos luminosos, destinos dançando

num ballet cósmico, efêmero.

A gravidade, um abraço fugaz,

que nos prende à poeira estelar,

antes que o sopro se dissipe.

 

O tempo, uma ilusão,

desdobra-se em camadas sutis.

O agora, um portal minúsculo,

onde o infinito se encontra.

Em cada respiração, um ciclo completo:

nascimento, vida, dissolução.

A eternidade, encapsulada

na brevidade de um instante.

Não há antes, não há depois,

apenas o eco do presente.

 

E a finitude, não um fim,

mas a essência da forma.

O contorno do que somos,

desenhado pela fragilidade.

Cada batida do coração,

um relógio que se cala,

mas que ressoa no todo.

Um átomo pensante,

diluído no oceano do ser,

testemunha silenciosa do próprio desaparecimento.

BRAÇO QUE PROCURA

 Braço Que Procura

 

Em mim, o braço que procura,

em desespero, o abraço.

Não o calor da pele apenas,

mas a concha que envolve o caos,

o porto onde o homem cansado

pode finalmente descansar.

 

É uma busca que não grita,

mas que pulsa em cada veia,

uma fome antiga por ser inteiro,

por preencher o espaço vazio

que a complexidade do eu insiste em abrir.

O braço se estende no ar frio,

no silêncio que me habita,

na rota que não chega a lugar nenhum.

 

Há uma sede de pertencimento,

um anseio por ser contido,

por diluir a própria solidão

no amparo de outro ser.

E nesse estender-se desesperado,

reconheço a fragilidade

e a força de ainda querer,

de ainda buscar

o porto que me complete.