O Vento na Não-Coisa
Há um sussurro que não tem boca,
uma cor que a retina não capta.
No avesso do tempo, um som sem fonte
desfia o fio que não existiu.
Sou o homem que vê o que não se mostra,
o que sente o peso do leve.
As palavras se desfazem na língua
antes de formarem sentido,
escorrem como areia por fendas
que não se abrem.
Há um mapa sem linhas,
um caminho que começa no fim
e termina no nunca.
Flutuam objetos sem nome
no espaço entre os pensamentos,
um cheiro de ausência,
o toque frio do imaterial.
E em cada pulso que não marca a hora,
mora o inexplicável,
a verdade nua do que não se compreende.
É a melodia de um silêncio infinito,
o reflexo de um rosto que não vejo,
o gosto da lembrança que nunca foi.
E eu, apenas eu,
observo a dança da não-coisa,
e nela, um sentido que me escapa,
mas que me habita por inteiro.