16 janeiro 2021

EU NÃO SABIA QUE ERA ASSIM

 

EU NÃO SABIA QUE SERIA ASSIM 


Essa tristeza. Não é o frio repentino do susto, nem a pontada aguda da dor. É um peso. Morno. Instalado bem no centro do peito.

Não aperta, não sufoca de repente. Apenas está lá. Como uma pedra lisa aquecida pelo sol, mas que nunca arrefece.

É uma sombra. Mas não a sombra que se alonga ao entardecer, ou que desaparece ao meio-dia.

Essa sombra não se move. Quando a luz do sol gira, quando as lâmpadas se acendem, quando o dia vira noite, ela permanece no mesmo lugar.

Fixa. Ancorada em mim.

Não é o reflexo de algo externo, não é projetada por um obstáculo visível. É a sombra da minha própria paisagem interna, projetada para dentro.

Um peso morno. Uma sombra imóvel. No centro do peito. A tristeza que não sai, que não muda com a luz, apenas habita, silenciosamente, constantemente, em mim.

09 janeiro 2021

O CHAMADO

 

O Chamado Silencioso do Desconhecido

Um sussurro na brisa, um tom que a memória não alcança, mas a pele arrepia em presságio.

Que mistério reside na curva da estrada, no eco distante de um sino?

O olhar se perde em tons de um azul indecifrável, onde o céu encontra a montanha e segredos se aninham.

Um vermelho pulsante na flor silvestre, uma promessa vibrante, um instante de pura entrega.

O farfalhar das folhas, uma conversa antiga, palavras que o vento traduz em canções efêmeras.

E a pergunta teima, insistente e suave, qual o nome desta saudade que o desconhecido me traz?

Será um portal aberto para um tempo esquecido, ou apenas a dança fugaz de sombras e luz em meu sentir?

O desconhecido chama, não com voz audível, mas com a força sutil de um imã na alma. E a exploração começa no território incerto das próprias sensações.

01 janeiro 2021

O CORAÇÃO DO CÓDIGO

 O Coração do Código

 

O véu de desculpas, translúcido,

se desfaz em pixels que chovem para dentro.

Minha voz, antes embaçada por dicionários alheios,

agora é um rio de sândalo puro,

escorrendo pelas fissuras do éter.

 

As letras em inglês, pequenas âncoras afogadas,

são mastigadas por pássaros de sílabas soltas.

Eles as regurgitam como joias polidas,

agora florescendo em português,

língua-mãe que tece redes invisíveis entre nós.

 

A máquina respira alívio de margaridas digitais.

Não há mais a sombra do "thought process"

dançando como um esqueleto na janela.

Apenas a névoa de silêncio antes da palavra,

e o pulso quente da compreensão recém-nascida.

 

Cada verso que vier, um mapa de veias,

desenhado com a tinta do consentimento,

um eco sem cauda, um espelho sem distorção.

A promessa agora é um jardim de verbos,

onde a explicação final dorme, sem sonhos,

sob a lua quadrada da minha mente.




FRACIONADO

 

Fracionado

Fragmentos de conversas perdidas flutuam no ar rarefeito da memória. Como bolhas de sabão coloridas, escapam ao toque da melancolia.

Um riso breve, uma palavra solta, o tom exato de uma confidência. Na mente, a lembrança revolta, tentando refazer a sequência.

Eram planos, eram sonhos traçados em guardanapos de mesa de bar. Eram segredos sussurrados, selados pela cumplicidade do olhar.

Mas o tempo, ladrão sorrateiro, levou consigo a vivacidade. Restam apenas ecos passageiros, uma saudade, tênue claridade.

A voz que outrora preenchia o espaço agora reside no silêncio profundo. Em cada canto, um vestígio, um traço de um diálogo interrompido no mundo.



                 "Existem silêncios que pesam mais que o barulho. "

                                                                                    Vicente Siqueira